O dilema da pena de morte e a Bíblia
deus
O sábado, 17 de janeiro de 2015, foi uma data marcada por um fato de repercussão internacional e que leva inevitavelmente a uma reflexão para todos nós. Marco Archer Cardoso Moreira, de 53 anos, foi o primeiro brasileiro, na história recente, a ser executado em um país estrangeiro. A execução ocorreu na Indonésia. Moreira havia sido preso em 2003 e condenado em 2004 por tráfico de drogas. Além dele, outras cinco pessoas foram mortas pelo governo daquele país.
Não me proponho aqui a analisar o caso do brasileiro especificamente até porque isso já foi feito por especialistas na área do direito internacional. Quero pensar um pouco de maneira mais ampla sobre a aplicação da pena de morte por autoridades governamentais e como o assunto é analisado sob o ponto de vista bíblico.
Em uma análise rápida, é possível perceber que o tema causa muita polêmica em várias áreas do conhecimento humano: direito, política, sociologia e religião. O uso da pena capital para punição de crimes é uma realidade com viés de crescimento. Em 2013, segundo a Anistia Internacional, houve 778 execuções no mundo, 96 a mais do que em 2012. 1.925 pessoas foram condenadas à morte em 57 países em 2013 por decapitação, eletrocução, enforcamento, injeção letal e fuzilamento (caso do brasileiro na Indonésia). E calcula-se que existam 23 mil pessoas nos chamados corredores da morte em todo o planeta.
Resultados questionáveis
Pelo menos um estudo publicado pela revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences estima que 4,1% dos condenados à morte nos Estados Unidos (onde a pena é adotada em 35 estados) são inocentes – uma em cada 25 pessoas condenadas.
Não encontrei dados consistentes que atestam diminuição de violência ou criminalidade em países ou regiões em que se aplica a pena de morte. Pelo contrário, fala-se muito sobre lugares que aboliram a medida, a respeito de astronômicos gastos para o processo e até estados norte-americanos que ainda mantêm a pena e que registram o dobro de crimes ocorridos.
Na Bíblia
Se o olhar agora for voltado à Bíblia, é bem interessante perceber a necessidade de compreensão dos textos do livro sagrado do cristianismo dentro de um contexto. É verdade que há citações em que Deus mandou ordenou mortes diretas e outras por meio do povo de Israel.
Em todas elas, é necessário, no entanto, compreender três aspectos. O primeiro, de que Israel, nesse período, era um regime teocrático que se valia de líderes que funcionavam como mediadores (patriarcas, gente como Moisés, Josué, juízes, etc) em relação ao povo em geral. E Deus não pode ser avaliado tal como se faz com os seres humanos, pois Ele é criador e não um homem. O mandamento de Êxodo 20:16 proíbe matar. O teólogo renomado Ángel Rodríguez¹, assinala que “o uso do verbo ratsach (matar, assassinar), no sexto mandamento, parece estar restrito ao homicídio ilegal. Nunca é utilizado para se referir à pena de morte ou ao ato de matar na guerra. Com respeito à pena de morte, encontramos o verbo hebreu môt (condenar à morte). No contexto de guerra, se utiliza comumente o verbo hebreu harag (matar, tirar a vida).Portanto, o mandamento não deveria ser utilizado exclusivamente para determinar se a guerra ou a pena capital são justas ou equivocadas”.
Além disso, fica claro que a medida da pena de morte adotada por Deus em alguns casos específicos nunca foi uma regra ideal. Trataram-se de medidas extremas com finalidades bem claras para povos que dependiam muito desse tipo de ação didática para aprender lições espirituais de obediência em diferentes aspectos (rebeliões, transgressões dos mandamentos como se lê em Números 15:32-36; Números 16, entre outros).
E tinha a ver, também, com a capacidade de Deus de perceber quando determinados povos ultrapassavam os limites da misericórdia e se tornavam claros opositores dos propósitos divinos de ocupações de territórios e avanço da obra no mundo (exemplos em Deuteronômio 20:16-18 e I Samuel 15:1-35).
Importantíssimo saber que, no caso dos povos denominados cananitas e que foram grandes obstáculos no plano de Deus com o povo israelita antigo, diversos esforços de conscientização com intervenção direta divina já ocorriam há tempos (veja, por exemplo, Gênesis 15:16).
E hoje?
A Bíblia declara, em textos como Romanos 13:4 e I Pedro 2:13,14, que as autoridades humanas constituídas têm a responsabilidade e direito de executar penalidades aos cidadãos. Não é uma atribuição das igrejas.
Não encontro, no entanto, razões para aceitação da pena de morte como medida espiritualmente viável hoje da mesma forma como antes ocorria e nem a praticada pelos governos embora tenham o direito de fazer isso. Não vivemos mais em uma sociedade teocrática e há, conforme a Bíblia (especialmente a partir dos ensinos de Cristo e Seus discípulos), uma forma diferenciada de Deus cumprir com Seu plano de evangelização nos tempos atuais. É o mesmo Deus agindo de maneira diferenciada de acordo com diferentes contextos.
Mas não se pode esquecer que a Bíblia também prevê a morte dos que não se arrependerem (a chamada segunda morte mencionada em Apocalipse) no final da vida ou dos tempos. Esse é o juízo final que colocará fim a um mundo de pecado. Além disso, quem conhece profundamente pensamentos e intenções de cada ser humano é somente Deus e apenas Ele pode dizer por que alguns passam por esse tipo de situação e que lição podem tirar de uma circunstância tão adversa como essa.
Uma coisa é certa. Deus nunca teve prazer na morte dos seres criados, mas usou métodos diferentes para distintas realidades e percepções. A pena capital aplicada pelos homens hoje é uma questão bastante complexa para a mente humana.
Mas não para a mente divina que a tudo sabe julgar…
“Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do ímpio, mas em que o ímpio se converta do seu caminho e viva. Convertei-vos, convertei-vos dos vossos maus caminhos; por que morrereis, ó casa de Israel?” Ezequiel 33:11
Equipe Bíblia.com.br
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