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É a Moralidade Determinada Pela genética?

Ciência

Os sociobiólogos aplicaram suas teorias à vasta gama de questões sociais. Desenvolveram idéias baseadas na adaptabilidade inclusiva para responder a questões concernentes ao estupro, homossexualismo, infanticídio, incesto, bissexualidade, poligamia e monogamia. As explicações deles estão fundamentadas na fé de que nossos genes egoístas fizeram de nós o que somos, porque qualquer comportamento fixado em nossa força genética é vantajoso para a sobrevivência.

Por Ronald L. Carter

O que é amor? Qual é a definição de beleza? Está a esperança relacionada com a fé? O altruísmo, é herdado ou cultivado? Quem decide questões de moralidade e questões de valores?

Houve um tempo em que tais preocupações eram indisputáveis responsabilidades dos filósofos e teólogos. Os cristãos, por exemplo, viam amor, fé, esperança e valores morais como exclusivas qualidades humanas que apontavam para Deus como o criador da humanidade. Aqueles que criam em um Deus pessoal se consolavam com o fato de que a ciência tinha pouca autoridade no estudo dos valores humanos e da fé.

Hoje, contudo, tal fundamento parece estar abalado. A teoria da evolução orgânica afetou a sociedade de maneira profunda e fundamental. Profundamente enraizada no paradigma da evolução naturalista, a ciência moderna aventura-se em áreas que no passado foram responsabilidades da metafísica ou da religião. Os biólogos evolucionistas, particularmente os especializados em sociobiologia, propõem teorias puramente naturalistas de como o comportamento “moral” e social se desenvolveram.

Por exemplo, sociobiólogos declaram conhecer a natureza genética do comportamento altruísta. Alguns chegam a propor os passos evolucionários que, supostamente, produziram o conceito de ‘justiça” e iniciaram a necessidade humana da religião.

Uma Base Biológica Para o Comportamento Social?

Em 1975, Edward O. Wilson, um entomologista da Harvard University, publicou o seu agora famoso livro, Sociobiology: The New Synthesis1.’ Wilson definiu a sociobiologia como o “estudo sistemático da base biológica para o comportamento social e da organização de sociedades de todos os tipos de organismos, incluindo os seres humanos”. Esta definição combinou conceitos genéticos da década de 1930 e os conceitos de adaptabilidade de Hamilton2 e Williams3 de maneira abrangente. A nova síntese de Wilson desencadeou o surgimento do interesse no comportamento social. Ela incendiou a imaginação de cientistas do comportamento e tomou-se um tópico popular para discussão e debate. A discussão destes tópicos no final da década de 1970 e início da década de 1980 era completamente controvertido. Muitos leigos, bem como cientistas, especialmente antropólogos e cientistas sociais, reagiram de forma violenta ao livro de Wilson. As preocupações deles eram coloridas por temores de que tal raciocínio sociobiológico iria ressuscitar formas do racismo social darwiniano.4

O debate criou confusão primariamente porque ele propunha um mecanismo evolucionário que parecia ameaçar aspectos da evolução darwiniana, a qual via a ação da seleção natural atuar no nível do organismo individual. A teoria de Darwin tomou-se sinônimo da frase “sobrevivência do mais apto”. A sociobiologia parecia desafiar esta interpretação, pela promoção da idéia de que o gene, não o indivíduo, é a unidade básica da evolução. Assim, desta perspectiva, o indivíduo é apenas um veículo para transferir o material genético de uma geração à outra.5

Em lugar de destruir a evolução darwiniana, como alguns haviam predito, a sociobiologia, de certa forma, veio para salvar a teoria da seleção natural. Comportamentos curiosos e estranhos, que haviam deixado Darwin e seus seguidores perplexos, vieram a ser interpretados à luz da sociobiologia.

O Papel dos Genes no Comportamento

O elemento central da teoria sociobiológica integrou uma compreensão de comportamentos altruístas e cooperativos em três conceitos: adaptabilidade inclusiva (Hamilton6), seleção de parentesco (Maynard-Smith7), e altruísmo recíproco (Trivers8). Hamilton primeiro enunciou o princípio geral de que a seleção natural tende a maximizar não a adaptação individual, mas a adaptação inclusiva; isto é, a probabilidade de um gene ser transferido depende não apenas da sobrevivência de um indivíduo específico transportando-o, mas do número total de cópias do gene a ser transferido para um grupo de indivíduos relacionados. A seleção de parentesco, ou a habilidade de realizar atos de altruísmo em benefício de parentes próximos, é uma importante parte da teoria da adaptação inclusiva.

De acordo com este conceito, seria adaptativo para um indivíduo sacrificar sua vida por dois ou mais irmãos ou oito ou mais primos. Irmãos partilham, em média, metade dos seus genes, e primos partilham um oitavo dos seus. Atos altruísticos são adaptativos apenas se a adaptação inclusiva de um indivíduo produz um resultado líquido para um gene particular.9 Assim, a adaptação inclusiva de um indivíduo depende não apenas da sobrevivência dos seus descendentes, mas também dos seus parentes próximos.

Se assumir que o comportamento é geneticamente causado, o altruísmo por um parente pode ser considerado como egoísta por parte dos genes responsáveis, uma vez que cópias do mesmo gene provavelmente estarão presentes em parentes próximos. O altruísmo pode também ser considerado como uma forma de egoísmo genético se por altruísmo um indivíduo poderia assegurar altruísmo recíproco em uma data posterior. O conceito de altruísmo genético, ao lado de várias formas de “cooperação”, provê exemplos de maneiras nas quais o “altruísmo” de parentescos independentes pode resultar de genes egoístas que procuram aumentar sua possibilidade de perpetuação.

Um animal ao arriscar sua vida por outro, ou ao desistir de suas oportunidades de reprodução para assistir outros adultos em cuidado de jovens, pareceu a Darwin ser contrário ao conceito da “sobrevivência do mais apto”, que ele havia cuidadosamente documentado. A mãe passarinho que pretende ter uma asa quebrada a fim de afastar o predador dos seus filhotes; a marmota norte-americana que atua como sentinela para outros membros do seu grupo; os pássaros “jay” da Flórida que se privam de cuidar dos seus filhotes para ajudar outros adultos no cuidado do ninho, não são senão alguns exemplos de comportamento que eram inexplicáveis para o conceito darwiniano da sobrevivência do mais apto.

Ao aplicar o conceito da adaptabilidade inclusiva, a sociobiologia proveu respostas para estes e muitos outros aparentes dilemas para o conceito darwiniano de seleção. Por exemplo, a marmota norte-americana que dá um grito de alarme quando um predador aparece, pode diminuir sua adaptabilidade individual ou sobrevivência, mas aumenta sua adaptabilidade inclusiva por ajudar seus parentes próximos. Os estudos de comportamento e genética descobriram que quando um jovem esquilo amadurece, os machos se dispersam para lugares distantes antes de se estabelecerem e escolherem um território. As fêmeas jovens não se dispersam, mas estabelecem seus territórios próximos ao seu lar. Consequentemente, as fêmeas têm muitos parentes próximos vivendo vizinhos a elas, mas os machos não. Exatamente corno a teoria prediz, são as fêmeas que dão o alarme de perigo, arriscando a vida.10 Os atos altruísticos de ••ajudador” dos pássaros “jays” da Flórida, bem como muitos outros atos de aparente altruísmo têm-se demonstrado geneticamente consistentes com as predições da seleção de parentesco.11

Dentre os insetos, Wilson observou formas de comportamento social que variam desde o tipo solitário de comportamento até um plenamente desenvolvido sistema de casta, onde sociedades complexas dividem o trabalho e escravizam outras espécies para trabalharem para eles. Ele combinou sua observação da evolução de várias formas de comportamento social com a nova compreensão de altruísmo (verdadeiro egoísmo genético) e propôs este mecanismo como a semente da qual a moralidade humana e a religião surgiram. Em seu ponto de vista, grupos parentes cooperando para ajuda mútua e adaptabilidade inclusiva, ampliam comportamentos que ajudam um ao outro, não a partir de “amor fraternal”, mas porque os seus genes foram selecionados para produzir um comportamento que maximiza a probabilidade de sua transmissão para as gerações sucessoras.

Implicações Para os Cristãos

Enquanto a sociobiologia provou ser uma teoria útil no estudo do comportamento ecológico e social, suas conclusões lógicas, quando aplicadas ao comportamento humano, apresentam implicações perturbadoras para os cristãos.

A sociobiologia promove a crença de que o comportamento humano e animal resulta meramente da interação dos genes e do ambiente sob as forças da seleção natural e do acaso. Wilson diz que •’nenhuma espécie”, inclusive a nossa, possui um propósito além do imperativo criado pela sua história genética” e que a espécie humana “‘não tem nenhum alvo exterior à sua própria natureza biológica”. Nosso egoísmo genético tem, portanto, criado “a mente humana como um mecanismo de sobrevivência e reprodução”.12 Essencialmente, isto faz de nós máquinas produtoras de genes egoístas.13

A biologia evolucionista naturalista não deixa nenhum espaço para Deus ou para absolutos morais. Desta perspectiva, certo e errado podem ser avaliados apenas no contexto dos resultados evolucionistas. “Censores e motivadores inatos existem no cérebro, que profunda e inconscientemente afetam nossas premissas éticas; destas raízes, a moralidade surge como instinto.”14

A moralidade, do ponto de vista cristão ou tradicional, está ausente na teoria evolucionista. Mesmo no conceito darwiniano de adaptabilidade – o “melhor” ou •’mais apto” – pode ser definido e apenas ser verdadeiro por uma série de condições ecológicas particulares, em qualquer tempo específico. Portanto, qualquer tentativa de extrair uma série de normas éticas da teoria evolucionista será, na melhor das hipóteses, relativista e condicional.

Os sociobiólogos aplicaram suas teorias à vasta gama de questões sociais. Desenvolveram idéias baseadas na adaptabilidade inclusiva para responder a questões concernentes ao estupro, homossexualismo, infanticídio, incesto, bissexualidade, poligamia e monogamia. As explicações deles estão fundamentadas na fé de que nossos genes egoístas fizeram de nós o que somos, porque qualquer comportamento fixado em nossa força genética é vantajoso para a sobrevivência.

A sociobiologia tem tentado colocar o estudo da moralidade e da ética em bases puramente materialistas. Wilson diz que a ciência “pode em breve estar na posição de investigar a própria origem e significado dos valores humanos, dos quais fluem todos os pronunciamentos éticos e muito das práticas políticas” .15 Ele ainda sugere que os cientistas e humanistas deveriam juntos considerar a possibilidade de que chegou o tempo em que a ética deve ser removida temporariamente das mãos dos filósofos e teólogos e ser confiada aos biólogos.

Embora a maioria dos cientistas desdenhe tal sugestão, em realidade isto é precisamente o que aconteceu.16 Sociobiólogos que discutem a respeito de moral e altruísmo são frequentemente acusados de cometerem uma “falácia naturalista” (é/deve ser falácia), a qual foi tornada famosa por darwinianos sociais, que tentaram justificar uma teologia natural baseada na teoria da sobrevivência do mais apto. Wilson e outros líderes da sociobiologia não estão defendendo que se estabeleça uma ética baseada naquilo que se encontra na natureza. Muitos deles creem que os humanos devem usar seus cérebros altamente desenvolvidos e avançarem além do instinto. De acordo com eles, o uso do intelecto e do consenso do grupo pode levar à uma ética superior através da evolução cultural.

Wilson crê que a religião se desenvolveu através da seleção natural e, portanto, é útil para nossa sobrevivência, mas agora chegou o tempo em que a ciência deve ajudar a criar expressões religiosas que contribuirão para a preservação da vida na Terra.

Wilson diz: a “principal tarefa da biologia humana é identificar e medir as repressões que influenciam as decisões de filósofos éticos e todos os demais, e inferir o significado delas através das reconstruções neurofisiológicas e filogenéticas da mente … No processo uma ética biológica será modelada, a qual tomará possível a seleção de um código moral de valores mais profundamente entendido e duradouro”.17

A Resposta Cristã

Qualquer tentativa de se definir moralidade e ética com base em uma teoria evolucionista claramente desafia o coração das crenças da Igreja cristã em geral. Como devemos responder? Alguns estudantes, confrontados com a lógica da sociobiologia e sua utilidade nos estudos do comportamento animal, têm abandonado a fé nas Escrituras. Outros têm rejeitado todas as formas de evolução. À primeira vista pode parecer que a sociobiologia requer uma escolha entre as Escrituras e a teoria da evolução.

Certamente, as teorias da evolução naturalista que rejeitam a Deus são incompatíveis com a Bíblia, mas isto não significa que as Escrituras e alguns aspectos do arrazoado sociobiologista sejam incompatíveis. A maioria do que é conhecido acerca do processo evolucionista, seu mecanismo e forças de seleção é compreensível mesmo com uma leitura conservadora das Escrituras. A Bíblia nos informa que desde o começo grandes mudanças ocorreram dentro da criação de Deus, particularmente como resultado da Queda e que estas mudanças foram transmitidas de geração à geração.

Creio que as leis divinas da Natureza se aplicam tanto aos humanos como a outras criaturas e que os organismos foram criados com comportamento, bem como com morfologias que desde então têm sido submetidas a gerações de mudanças, ocasionadas por mutações e recombinação e têm sido moldadas por seleção natural. Como resultado, parte do caráter humano reflete gerações de seleção natural que tem enfatizado o lado egoísta da nossa natureza. A Bíblia diz que os humanos não são em todos os aspectos biologicamente determinados, mas que possuem uma medida de livre arbítrio que permite buscarem de Deus habilidade para agirem de formas verdadeiramente altruístas. Tal comportamento não é o resultado de modificações genéticas e determinismo biológico.

É possível que o processo básico de seleção de parentesco e seus efeitos em habilidade inclusiva tenha operado entre os humanos e entre outros grupos de organismos criados. O aceitar esta noção não requer que se assuma que a vida tenha evoluído de uma única célula ou que a evolução tenha criado a moralidade.

Tendo dito isto, a resposta cristã ao desafio da ciência na área da moralidade e valores permanece inevitável.

Primeiro, manter compromisso com a verdade. Mais do que em qualquer outro tempo, é necessário que os cristãos desenvolvam formas de integrar as verdades que são reveladas de diversas fontes, bíblicas bem como científicas, enquanto mantêm sólida fé nas Escrituras. O compromisso com uma fonte não implica na negação da outra.

Segundo, ser mais ativo no desenvolvimento de valores. Há muito que os cristãos podem aprender de outros métodos de pesquisa, incluindo a sociobiologia, acerca de como os valores são aprendidos, desenvolvidos e nutridos e como o desenvolvimento moral acontece. Num tempo em que a humanidade, incluindo a comunidade científica, está buscando formas de replantar as sementes da moralidade e valores dentro da sociedade e num tempo em que os sistemas de valores parecem estar em crise ao nosso redor, os cristãos têm tanto um dever religioso como sociológico. Certamente os cristãos, os quais têm um imperioso compromisso com um objetivo sistema de valores e fé inabalável no poder de Deus para transformar os seres humanos, não devem fugir de sua responsabilidade para com a sociedade em promover o desenvolvimento de valores sólidos.

Terceiro, fazer desafio ao estilo de vida. Em última análise, a crença de que Deus é o doador de todas as leis morais e Aquele que habilita para que tais leis sejam observadas será provada na corte do estilo humano de vida. Demonstramos em nossa conduta, que, por causa de nossa confiança em Deus, somos capazes de evidenciar tanto interesse próprio como altruísmo?

Ronald L. Carter (Ph.D ., Loma Linda University), é um pesquisador e ministro ordenado que ensina biologia em sua alma-mater, com ênfase em sistemática molecular. Seu campo de trabalho o tem levado ao coração da selva amazônica.

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