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Não se tira dos filhos o pão para dar aos cachorrinhos

Jesus.

Como entender essa frase de Jesus?

No Novo Testamento, em Mateus, uma mulher pede a Jesus que cure sua filha endemoniada e Jesus diz: “não se tira dos filhos o pão para dar aos cachorrinhos”. Como entender esta passagem?

Em Seu ministério Jesus não se limitou a trabalhar pela salvação dos judeus apenas. Embora tenha vindo para os Seus, muitos O rejeitaram (João 1:11). O sentido supremo desta passagem é que ela preanuncia a propagação do evangelho a todo mundo; mostra-nos o princípio do fim de todas as barreiras. O contexto histórico evidencia que Jesus havia sido rejeitado na Judéia e na Galiléia e assim Ele se retirou para os lados de Tiro e Sidom para ter um período de tranquilidade antes do alvoroço do fim (Mateus 15:21 e Marcos 7:24).

Não se trata em nenhum sentido de uma fuga de Jesus; é uma imagem de Jesus adquirindo forças e preparando-se, Ele e seus discípulos, para a luta final e decisiva que tinha pela frente. Porém até nesse território estrangeiro Jesus não se veria livre do clamor da necessidade humana. Havia uma mulher que tinha uma filha gravemente doente. De algum modo esta mulher tinha ouvido a respeito das coisas maravilhosas que Jesus podia fazer (Marcos 7:25), e seguiu a Jesus e a seus discípulos, rogando desesperadamente que a ajudassem. A princípio, Jesus parecia não lhe prestar atenção. Os discípulos estavam confundidos. “Dá-lhe o que pede”, diziam, “e livre-se dela” (ver Mateus 15:23).

A reação dos discípulos não era um sentimento de compaixão. Pelo contrário, para eles a mulher era um estorvo e queriam livrar-se dela o mais rápido possível. Atender a um pedido para livrar-se de alguém que é, ou pode converter-se em um estorvo, é uma reação muito comum, mas é muito diferente do amor, da compaixão e da piedade cristãos. Mas havia um problema. Não podemos duvidar por um instante de que Jesus sentia compaixão pela mulher, mas ela era uma gentia. Não só era gentia, mas também pertencia aos cananeus e os cananeus eram inimigos ancestrais dos judeus. Nessa mesma época, ou não muito depois, Josefo podia escrever: “Dos fenícios, os de Tiro são os que têm os piores sentimentos contra nós.” Jesus aproveitaria a oportunidade e ensinaria aos discípulos uma grande lição de como se deveria trabalhar pela salvação de todas as pessoas, inclusive dos pagãos.

Já vimos que se Jesus queria ter algum efeito devia limitar seus objetivos, como um general prudente. Tinha que começar pelos judeus (Mateus 15:24); e aqui se encontrava com uma mulher gentia que clamava por misericórdia. Jesus só podia fazer uma coisa: devia despertar uma fé autêntica no coração dessa mulher. De maneira que Jesus por fim se voltou para ela: “Não é bom tomar o pão dos filhos e lançá-lo aos cachorrinhos” (Mateus 15:26). Chamar cão a alguém era um insulto mortal e pejorativo. O judeu falava com uma arrogante insolência de “os cães gentios”, os “cães infiéis” e, mais adiante, dos “cães cristãos”. Naqueles dias os cães eram os sujos habitantes das ruas – animais fracos, selvagens, frequentemente doentes. Mas devemos lembrar duas coisas. O tom e o olhar que se empregam para dizer algo fazem uma grande diferença.

Inclusive algo duro pode dizer-se com um sorriso que desarma. Podemos chamar um amigo “vilão” ou “vadio” com um sorriso e um tom que lhe tira toda maldade e o enche de afeto. Podemos estar seguros de que o sorriso no rosto de Jesus e o tom de sua voz tirou toda a amargura e o insulto de suas palavras. Em segundo lugar, emprega o diminutivo de cães (kunaria) e os kunaria não eram os cães vagabundos mas os cães de madame, muito distintos dos vira-latas que assolavam as ruas e revolviam os montões de lixo. A mulher era grega, de rápida percepção e com o engenho dos gregos. “Sim”, respondeu, “porém os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus donos”. E os olhos de Jesus se iluminaram de alegria ao perceber uma fé tão indomável; e lhe outorgou a bênção e a saúde que tanto desejava.

Devemos assinalar certas coisas a respeito desta mulher:

(1) Primeiro e sobretudo, experimenta amor. Como dissera Bengel a respeito dela: “Fez sua a miséria de sua filha.” Podia ser pagã, mas em seu coração estava esse amor por sua filha que sempre é o reflexo do amor de Deus por suas criaturas. Foi o amor que a fez se aproximar desse estrangeiro; foi o amor que a fez aceitar seu silêncio e continuar sua súplica. O amor foi que a fez suportar sua aparente rejeição. Foi o amor que a fez capaz de ver a compaixão por trás das palavras de Jesus.

A força impulsionadora do coração desta mulher era o amor; e não há nada mais forte e mais perto de Deus que o amor. Esta mulher tinha fé.

(a) Era uma fé que cresceu em contato com Jesus. Começa chamando-o “Filho de Davi”, reconhecendo-o como o Messias. Termina chamando Jesus de “Senhor”. É como se Jesus a tivesse obrigado a olhá-lo e a mulher tivesse visto nEle algo que não se podia expressar em termos terrenos, pois de fato, embora fosse humano, era divino. Isso era justamente o que Jesus queria suscitar nela antes de conceder seu pedido. Queria que ela compreendesse que seu pedido devia converter-se em uma oração a um Deus vivo. Podemos ver como cresce a fé desta mulher enquanto se depara com Cristo até que o vê.

(b) Era uma fé que adorava. Começou seguindo-o, terminou ajoelhada. Começou com uma petição, terminou com uma oração. Cada vez que nos aproximamos de Jesus devemos fazê-lo em primeiro lugar em adoração de sua majestade, e só depois devemos expressar nossa necessidade.

(3) Esta mulher tinha uma persistência inquebrantável. Não se deixava desalentar. Como já dissemos, há muita gente que ora porque não quer perder a oportunidade. Não acreditam na oração em forma autêntica; só sentem que pode ser que aconteça algo e não querem perder a oportunidade. Esta mulher se aproximou não só porque Jesus era o único que podia ajudá-la, mas sim porque era sua única esperança. Aproximou-se com uma esperança apaixonada, com um claro sentimento de necessidade e disposta a não sentir-se desalentada.

(4) Esta mulher tinha o dom da alegria. Estava em meio da aflição; apaixonadamente ansiosa; e entretanto, podia sorrir. Havia nela uma espécie de alegria cheia de luz. A mulher se aproximou de Cristo com um amor audaz, com uma fé que cresceu até adorar aos pés do divino, com uma insistência inquebrantável que brotava de uma esperança invencível, com uma alegria que não aceitava o desalento. Essa é a fé que não pode deixar de receber uma resposta a suas orações. (William Barclay, Comentário Bíblico de Mateus), p. 550-553.

Equipe Biblia.com.br

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